Domingo, 21 de Março de 2010

As comemorações devem ser dias de reflexão e não dias de promoção pessoal

Associação de Protecção e Conservação do Ambiente / APCA

As comemorações devem ser dias de reflexão e não dias de promoção pessoal 

 

Nos próximos dias comemoram-se uma série de dias, curiosamente, todos eles interligados, isto é, o Dia da Agricultura (20 de Março), Dia Mundial da Floresta (21 de Março), Dia Mundial da Água (22 de Março) e o Dia Mundial da Meteorologia (23 de Março). A Associação de Protecção e Conservação do Ambiente – APCA, para além de um conjunto de actividades, que desenvolve ao longo do ano, por entender que as comemorações são importantes mas o preconizado nas mesmas deve ser uma prática diária dos organismos e senhores que se servem destes dias para se promoverem, não pode deixar de fazer um balanço da situação no Minho. Relativamente à Agricultura e Floresta a situação no Minho é deveras preocupante, salvo raríssimas e louváveis excepções, muito pontuais, que não deixam de ser importantes, enquanto exemplos demonstrativos de que é possível inverter-se a presente situação, mas sem expressão, em termos percentuais, na área total dos espaços agrícolas minhotos nos quais se insere a Floresta do Alto Minho, sendo notório o estado calamitoso em que se encontram. Relativamente à Agricultura, alerta-se para as barbaridades que têm sido cometidas e continuam a cometer-se no que diz respeito à destruição de óptimos solos com elevada aptidão agrícola, ao serem utilizados para edificação. Aproveita-se para alertar que o combate à corrupção dos conhecidos senhores 20% (valor actualizado face à inflação nos últimos anos) passa por acautelar-se prevenindo-se as transformações meteóricas de terrenos agrícolas em terrenos com capacidade edificativa, de que o exemplo mais marcante, entre outros, na última década é a surpreendente operação do Engenho do Maneta no Perímetro de Emparcelamento das Veigas de Afife, Carreço e Areosa. Trata-se, certamente, dum óptimo compêndio para ser utilizado como “Caso de Estudo” no Centro de Estudos Judiciários, no âmbito do combate aquilo que não pode acontecer num Estado de Direito Democrático.

É inquestionável, para a APCA, que a Floresta Minhota é um dos recursos naturais da região, mais importantes, no desenvolvimento e sustentabilidade deste espaço territorial, destacando-se o relevo da fileira florestal do Alto Minho, na economia regional, assim como entre as suas múltiplas valências, o papel de sorvedouro de CO2 (Dióxido de Carbono), num momento em que as alterações climáticas estão na ordem do dia em termos mundiais. Contudo a importância deste recurso natural renovável, nas estratégias de desenvolvimento e sustentabilidade do Minho, ou não tem sido considerado ou simplesmente é-lhe atribuído um papel secundário ou mesmo residual, entendendo a APCA que a alteração deste quadro impõe a adopção urgente de um conjunto de medidas de que destacamos as seguintes, conforme temos vindo, ano após ano, a divulgar:

·         Adequar a nossa floresta às alterações climáticas em curso, sem esquecer as especificidades regionais e locais;

·          

·         Emparcelamento das propriedades florestais de forma a ganharem dimensão;

·         Contrariar a dispersão e abandono das explorações florestais;

·         Inversão do abandono das práticas agrícolas ligadas ao ciclo de estrumação das terras com mato, associado ao despovoamento humano / migração, adubos químicos, etc

·         Incentivo de práticas agrícolas suportadas na utilização de adubos naturais, tais como o mato e sargaço;

·         Incentivos que evitem o abandono das explorações agrícolas, particularmente, no interior do Alto Minho, onde a situação é muito preocupante;

·         Melhorar e incentivar a limpeza e intervenção cultural dos povoamentos, que acumulam matéria combustível no sub-bosque, dado facilitar a propagação de incêndios;

·         Entre outras medidas incrementar-se o aproveitamento energético da biomassa florestal;

·         Reduzir a monoespecificidade e continuidade dos povoamentos de pinheiro bravo;

·         Melhorar a insuficiente ou inadequada rede viária e divisional instalada;

·         Controlo do aumento das áreas de matos / incultos e destruição dos povoamentos;

·         Obstar à expansão de infestantes, concretamente da Acacia longifolia, a partir dos sistemas dunares compreendidos entre os rios Minho e Neiva.

Entende a APCA que não é necessário gastar-se mais dinheiros públicos em mais diagnósticos sobre a Agricultura e Floresta do Minho, os existentes já são mais que suficientes. Não são necessários mais gabinetes ou comissões para se repetirem e sobreporem-se nas tarefas que exercem. A Agricultura e Floresta do Alto Minho precisa de acções concretas, que de uma forma estruturada e planeada definam e calendarizem o tipo de floresta que melhor se adequa ao desenvolvimento auto-sustentado do Minho e a sua gestão integrada. Analise-se e reflicta-se sobre o que se fez nos últimos 16 anos, por exemplo, na Serra de Santa Luzia, que alguns analistas consideram um período dilacerante da floresta e denominam como o período do “pretenso defensor da serra”.  

No chamado ciclo dos incêndios (1998, 2005, 2012?) e como reflexão não devemos esquecer o sucedido em 2005, no Alto Minho, particularmente, no concelho de Viana do Castelo, em que arderam cerca de 70% dos 12978 hectares da área florestal deste concelho, ou seja, um terço da área total deste município. Considerando os milhões de euros investidos, na última década, como por exemplo na Serra de Santa Luzia, impunha-se conhecer o porquê do sucedido, como salvaguarda do futuro e prestação de contas sobre a aplicação dos dinheiros públicos. Depois de muitas reuniões e tal como é habitual ficou tudo na mesma, com umas operações de “cosmética florestal sob a batuta do pretenso defensor da serra” nos sítios mais visíveis, para que não digam que nada foi feito, mas sem que se vislumbre uma visão integrada. Os resultados estão à vista…e o pretenso defensor da serra, foi obrigado a mudar de ares, esperando-se agora que a situação se altere.

 Na verdade, em 2005 foram registados no Alto Minho 2426 incêndios, de que resultou a combustão de 15439 hectares de povoamentos e 11629 hectares de matos, portanto um total de 27068 hectares que representa cerca de 35% da área total florestal do Alto Minho. Note-se que cerca de 30% da área total ardida no Alto Minho teve lugar no concelho de Viana do Castelo, o

que evidencia que porventura não será com o tipo de investimentos efectuados, que se consegue debelar ou pelo menos minimizar o dizimar cíclico do Alto Minho pelos incêndios, salientando-se que em 2005 a área ardida no concelho de Viana do Castelo mais que duplicou os valores de 1998, em que arderam 4048,47 hectares. A manter-se tudo na mesma, e considerando as linhas de tendência reveladas pelas séries estatísticas existentes para este espaço territorial, estaremos porventura em 2011 / 2012, novamente, a lamentar a área ardida, enquanto o pretenso defensor da serra passou a assobiar noutras paragens.

 

Desde, 2005, que a APCA alerta para esta possibilidade, cuja probabilidade é elevada. Pergunta-se, o que foi feito até agora?

Genericamente a floresta do Alto Minho necessita que cada organismo desempenhe as competências e atribuições que a lei lhes confere, sem sobreposições ou competições descabidas e inaceitáveis. A Floresta não precisa de competições de organismos para saber “quem manda mais” ou consegue captar mais fundos comunitários para se auto-sustentarem. A floresta precisa apenas de um organismo da administração central ou regional, que coordene e fiscalize as acções de produção, exploração, conservação e gestão da floresta, que por sua vez são incumbências e responsabilidades dos proprietários da floresta, que para o efeito se devem associar. O Estado, através da administração pública (central, regional ou local), apenas tem que definir regras e exigir que os titulares da floresta as cumpram e sancionar levando à barra da justiça os pretensos defensores da floresta, pelos actos que praticaram lesivos do interesse público. O combate à corrupção também passa por uma actuação nestes domínios. Tomando como exemplo a Serra de Santa Luzia em que 99,99% é privada, e considerando, ainda, as dezenas de milhões de euros públicos investidos, nesta serra, será que alguém já teve o discernimento de fazer um balanço de benefícios e custos? É evidente que se alguém fizer esse balanço chegará a valores negativos impensáveis, todavia continua-se a cometer os mesmos erros nas acções empreendidas.

Proteger-se a Agricultura e a Floresta, agir sobre estes espaços de forma inteligente, é também uma forma de se comemorar o Dia da Água e da Meteorologia atendendo ao papel que as primeiras têm no âmbito dos recursos hídricos e na amenização climática da região. É um trabalho de todos para todos, onde ninguém pode ficar de fora, particularmente, aqueles que representam o Povo Minhoto, que infelizmente parecem andar mais preocupados com a sua promoção pessoal do que com os problemas reais das populações que representam. As acções pontuais por muito louváveis que sejam nunca deixarão de ser um mero paliativo, impondo-se acções concretas se queremos valorizar a Agricultura Minhota, recuperar e conservar a Floresta, proteger os recursos hídricos e preparar-nos para as alterações climáticas em curso. O tempo não é para pretensos defensores do que quer que seja, mas de acções concretas que incrementem um desenvolvimento equilibrado, estruturado e auto-sustentado do Minho, pensando nas gerações do presente e futuras.          

 

Afife, 19 de Março de 2010                                                         

A Direcção da APCA

publicado por afifeambiente às 14:27
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